Photo: Sergio Araujo  Photo: Sergio Araujo
José Carlos Cavalin  Artur Norberto Heger




Quais são as espécies que você considera que estão mais ameaçadas?

Tem uma série delas. Tem espécies no Brasil que talvez nem sejam conhecidas. Estamos procurando dar uma certa prioridade a plantas que sejam novas. Se há uma planta que existe há milhares de anos e só foi descoberta agora, qual seria o motivo? O habitat dela é muito restrito e se ele é restrito, pode estar encravado no meio de uma serra, seja onde for e sendo muito pequeno, pode, a qualquer momento, desaparecer. Esta é uma planta que precisa urgentemente ser preservada mesmo que no habitat haja centenas delas.

Kefferstenia ventricullares.Photo:Sergio Araujo Qualquer alteração no ecossistema pode provocar seu desaparecimento.

Exatamente. Nós partimos deste princípio, uma espécie nova tem que ser produzida de imediato, às vezes as pessoas dizem que não é preciso, que tem milhares de onde veio esta aí. Não importa que tenham milhares naquele lugar. Não é interessante que se tirem milhares de plantas e se coloque no comércio pois se estará incentivando a retirada da planta e facilitando a sua destruição. Eu nunca me esqueço da possibilidade de um acidente.

De um acidente ou da exploração de uma jazida qualquer.

Isto também eu considero um acidente. A construção de uma hidroelétrica para a natureza é um acidente, um acidente provocado mas ainda assim um acidente.

Onde e como este projeto está sendo executado?

Nós trabalhamos em São Paulo, no sítio do Cavalim onde temos a produção das plantas. Como nosso trabalho não é auto-suficiente, nós dois trabalhamos em outras coisas e nos dedicamos ao projeto no fim de semana.
Ornithocephallus grandiflora.Photo:Sergio Araujo Nós recebemos as plantas nos vidros, nos frascos e fazemos o replante em casa, nas horas de folga e no fim de semana, quando vamos para o sítio, levamos as plantas. Como nós só vamos lá uma vez por semana, as plantas ficam aos cuidados do caseiro que se incumbe praticamente só da rega. Se nós tivéssemos mais tempo para cuidar das plantas, elas se desenvolveriam mais depressa mas nós teríamos que parar de trabalhar e isto nós não podemos fazer.
Nossa idéia inicial do trabalho foi voltada para começarmos a mostrá-lo no Congresso Mundial, que se realizou o ano passado, no Rio de Janeiro. Foi justamente isto que nós fizemos mas já antes havíamos participado de algumas exposições em São Paulo.
Quando se começa a ver que as plantas já têm um porte, que começam a ser aceitas, é preciso colocar alguma coisa mercado. Nossa estrutura atual tem em torno de 400, 450m² de estufa e aproximadamente 120.000 plantas. Grande parte destas plantas precisa de replante para vaso maior, mas se replantarmos todas as plantas que estão necessitando, nós já lotaremos uma outra estufa de 450m², que está em fase de construção. Comercializar algumas plantas de porte pequeno é interessante, primeiro porque estará entrando algum dinheiro para o projeto e depois estaremos retardando a necessidade de mais espaço.

E o preço final de cada planta, como fica?

Maxillaria ochroleuca.Photo:Sergio Araujo Para analisarmos o preço pelo qual é comercializada uma planta, é preciso considerar que a partir do momento da polenização da flor, tem-se em torno de 5 a 6 anos de trabalho até que ela chegue a um tamanho de 2 ou 3", incluídos os 6 meses a um ano de cápsula. Por causa da nossa falta de tempo, temos um sistema de só retirar a planta do frasco em tamanho grande. Feito o frasco mãe de semeadura, nossas plantas passam no laboratório por dois repiques iniciais. Um primeiro repique é feito quando elas atingem em torno de 1 cm ou menos e, quando atingem o porte de 1.5, 2cm, elas passam pelo último repique e, em geral, quando estão com 3 a 6cm de altura, nós tiramos do frasco.
Não há vaso coletivo, passamos direto para o vaso individual. Como nosso problema é mão-de-obra, nós queimamos esta etapa, pois colocar a planta no coletivo, deixá-la desenvolver-se por 6 meses a um ano, tirar do coletivo, passar para o primeiro individual que é um copinho de plástico de café para baratear o custo, deixá-la por 6 meses a 1 ano, passar de novo para o outro vaso, deixá-la por 1 ou 2 anos para atingir este porte de 2 a 3" para comercializar a planta, nós teríamos 3 procedimentos de plantio. Se nós a tiramos mais tarde do frasco, deixando-a atingir um tamanho maior, nós queimamos esta etapa, tendo apenas 2 procedimentos. Embora talvez atrasando um pouco o desenvolvimento da planta, nós estamos ganhando em mão-de-obra, em procedimento e para nós, no momento, o mais importante é isto.

Mas com 120.000 plantas, vocês já têm que ter uma infra-estrutura de pessoal para tocar o projeto?

Conforme já disse somos nós dois e o caseiro que só cuida da rega e eventualmente passa a planta do copinho do café, ainda plantado em musgo, para o outro vaso mas o resto não dá.
Pleurothalis sp..Photo:Sergio Araujo Reconhecer uma planta de orquídea quando ela está com 2 ou 3cm de altura, é difícil, se dermos a ele para replantar, ele vai plantar o capim que brotou e a orquídea vai ser jogada fora. Mesmo porque se você está trabalhando com um único tipo de plantas, Cattleya, seja ela qual for, são muito parecidas mas se for Cattleya, Oncidium, Laelia, Pleurothallis, Maxillaria, são muito diferentes, nós mesmos, às vezes, puxamos uma plantinha do vaso e ficamos na dúvida se tiramos o mato ou a orquídea. Nós precisaríamos de uma mão-de-obra muito, muito treinada, com muito conhecimento. Este tipo de pessoa quase não existe e quando existe, custa caro. Então nós trabalhamos sozinhos.

Quais as espécies com as quais vocês mais trabalham?

Estamos colocando no comércio uma série de Cattleyas brasileiras, buscando as mais incomuns, como Cattleya kerrii, porphyroglossa, da Bahia, schofeldiana, Laelia como a fidelensis, uma série muito grande de Oncidiums, mais de 30, Encyclia com 3 ou 4 espécies, Epidendrum, Zygopetalum com 3 ou 4 espécies, Promenaea com 3 espécies, Sophronitis pygmaea, do Espírito Santo. Estamos produzindo uma série de Bifrenarias, plantas sem grande apelo comercial. Nós começamos a comercializar as plantas há aproximadamente 3 anos.

Então no total, vocês já têm 7 anos no mercado?

Não, nós temos 7 anos de trabalho de produção. Ainda não tem 3 anos que nós começamos a comercializar as plantas. Pleurothallis arcuata
As primeiras plantas já começaram a florir mas nós começamos a comercializar muito cedo e não fizemos o que se deve fazer, guardar as melhores plantas para vê-las florir. Se vamos pegar 20 plantas num lote de 200 plantas para vender e escolhermos as 10, 15 maiores para nós e levarmos as outras, vamos levar plantas de tamanho insignificante. O que acontece é que são justamente estas 10 ou 15 que cresceram mais que escolhemos para vender.
Hoje em dia acontece muito de encontrarmos colecionadores que nos dizem que a plantinha que compraram há 1, 2 anos está florida e as nossas ainda não. Tem uma outra coisa, como não temos tempo de ficarmos em cima, o desenvolvimento da nossa planta é mais lento do que na maioria dos orquidários, pois não sofre excesso de adubação que alguns produtores utilizam e, por isto, é muito comum uma pessoa comprar nossa planta e ela dobrar de tamanho em pouquíssimo tempo justamente porque ela vai receber um trato melhor do que o nosso.
Isto de certo modo é muito bom, o cultivador vem nos dizer que a sua planta está mais bem cultivada do que a que ficou conosco.

Mas por que vocês não guardam estas plantas maiores para o acervo do projeto?

Catasetum apendiculatum.Photo:Sergio Araujo A questão é a seguinte, nós precisamos vender pois até agora nós só colocamos dinheiro e partir do momento que nós não colocarmos mais, será um grande passo. Mesmo que nós não possamos largar nossas atividades ainda, nós podemos reduzir o tempo dedicado a elas. Em vez de termos que trabalhar 4 dias por semana ganhando dinheiro para sustentar o projeto, poderiamos trabalhar 2 dias por semana para nos sustentarmos e trabalhar o restante do tempo com as plantas pois mesmo que elas não nos sustentem, nós não precisaremos mais sustentá-las. Aí nós poderemos trabalhar mais, nos dedicarmos às plantas e o desenvolvimento será muito mais rápido. Mas isto é a longo prazo, nós calculamos mais 2 a 3 anos para parar de investir e mais 3 ou 4 anos para começar a ter retorno. A planta maior, em tamanho de floração, mesmo que não esteja florida ainda, tem muito mais apelo. Nós temos plantas que florescem em todas as épocas do ano, nós não podemos levar na exposição só aquelas que estão floridas principalmente se nosso trabalho é em cima da preservação, nós temos que levar material de interesse. Nós não podemos dizer ao colecionador que naquela exposição ele não pode comprar a planta que ele quer, que está interessado, que só vamos vender quando estiver florida.

Imaginamos que o orquidófilo que já tem um certo número de plantas, que quer uma determinada planta, ele aceita comprar uma de pequeno porte mesmo sabendo que vai ter que esperar muito tempo para vê-la florir mas o comprador menos especializado prefere comprar a planta florida ou cujas flores estejam prestes a abrir, não?

Isto é muito relativo. Nós sentimos uma certa resistência das pessoas em comprarem uma planta pequinininha porque já passaram pela experiência de comprar e perder a planta, justamente por causa do problema que falei do excesso de tratamento que ela sofreu e quando vai para as mãos do orquidófilo, ele não dispensa o mesmo tratamento, então ela definha e morre. Como nossa planta não teve este excesso, ela consegue sobreviver com o tratamento que lhe é dispensado. Mesmo pensando que a planta pode morrer, a pessoa compra e leva porque ela custa baratinho. Esta mesma pessoa volta a se encontrar conosco, na mesma exposição, 1 ano depois e diz que a plantinha cresceu e está quase dando flor e aí leva mais 3 e assim sucessivamente. Na revenda em São Paulo, nós já temos um grupo pequeno de pessoas que nos obriga a levar novidades para todas as exposições. Normalmente, nas exposições, nós levamos uma média de 40 a 50 espécies diferentes, às vezes até mais de 70, mas temos que procurar atender toda a gama de público.

Quantas espécies vocês cultivam no geral?

Nós já passamos de 1.000 semeaduras e, sendo otimista, com 50% de sucesso e já tiramos dos frascos de 300 a 350 espécies ou semeaduras diferentes.
Alguma coisa é híbrido primário primeiro porque alguns também ocorrem na natureza e depois exercem uma certa atração sobre as pessoas. Quando você diz que é resultado de duas espécies diferentes, que você está criando uma coisa nova, ela se fascina por isto e adquire a planta justamente por ela ser um híbrido e não uma espécie. Se, por acaso, nós tivermos reprodução de uma planta que apesar de ser um híbrido, existe também na natureza ou seja um inseto cruzou plantas diferentes, o fascínio é maior ainda. Muitas pessoas procuram um híbrido primário que seja natural, mesmo que o que fazemos seja artificial, mas sabendo que existe na natureza elas se sentem atraídas.

E aquela pequena estufa que vocês usam, é um projeto seu?

É o que nós chamamos de micro-estufa. É um trabalho que estamos desenvolvendo para o cultivo de plantas de pequeno porte. Muita gente diz que não gosta de plantinha pequena pois se colocá-la no orquidário, não vai nem ver, não vou cuidar dela.
Com a micro-estufa, a planta pode ser cultivada dentro de casa. É um ambiente com iluminação artificial, ventilação, controle de umidade, de temperatura e tudo o mais que for preciso para o cultivo destas plantas pequenas.
Maxillaria sp.Photo:Sergio AraujoEla facilita para cultivar seedlings, plantas de pequeno porte ou se tiver interesse em plantas de um determinado clima muito específico, é possível reproduzir este clima lá dentro. Você pode, por exemplo, na praia, cultivar plantas como Masdevallias originárias dos Andes. Outro exemplo, em Porto Alegre, cultivar plantas do Amazonas. Isto é uma coisa que até existe fora do país, eu tomei conhecimento dela através do Peter (Orquidário Morumbi), que viu alguma coisa do tipo em Europa. Usei a experiência que eu já tinha com terrários, fui estudando como fazer, fazendo modificações, adaptação de material, aprimorando, procurando soluções para os problemas que apareciam. Assim eu acabei chegando a este formato atual, se ele é definitivo? Não sei, talvez eu ainda vá desenvolver alguma coisa.

Se alguém estiver interessado em adquirir uma micro-estufa, você pode projetá-la e executá-la?

Sem dúvida, se alguém quiser um projeto, nós fazemos e executamos.


Correspondência para o Projeto Caapora:

A/C Artur Norberto Heger
Rua Melo Matos, 42
Ipiranga
04280-040
São Paulo - SP
Tel: (011) 273-3840
Fax: (011) 216-9838



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