É impossível falar de Jorge Verboonen sem falar do Orquidário Binot, fundado em l870, por Pedro Maria Binot, com o nome de Etablissement P. M. Binot.
A história de sua fundação começa na Europa quando Jean Baptiste Binot, paisagista de profissão, extremamente desgostoso com a perda de sua única filha, decide abandonar a Europa e escolhe, ao acaso, no cais do porto, o primeiro navio para partir com sua família. Quis o destino que fosse o Rio de Janeiro. Em l845, em Petrópolis, estabeleceu-se como jardineiro-horticultor, vendendo plantas e árvores frutíferas.

Destacou-se a tal ponto que foi encarregado pelo Imperador Dom Pedro II, em l854, para projetar e executar os jardins do Palácio Imperial de verão, em Petrópolis (hoje Museu Imperial) em detrimento de um projeto já existente de Glaziou. Como prêmio pelo trabalho executado no Palácio, o Imperador lhe deu 6 escravos para ajudar a cultivar as terras que possuía no Retiro (que teria sido também doado pelo Imperador). O estreito relacionamento mantido entre ambos, fez com que o Imperador fosse padrinho de seu filho, Pedro Maria Binot, cujo nome foi escolhido, provavelmente em homenagem a ele.
Em princípio, Pedro não manifestou nenhum interesse pela jardinagem e mostrava um temperamento aventureiro e independente. Seu pai queixou-se ao padrinho que, com o intuito de impor uma certa disciplina ao rebelde, mandou prendê-lo. Ao tomar conhecimento do fato, o jovem Pedro fugiu para o Rio de Janeiro mantendo-se oculto até que a ira do pai e do Imperador se aplacasse. Por razões não muito esclarecidas, talvez para arrefecer a ira dos dois, aceitou ir estudar horticultura na Bélgica, em Gand, onde se diplomou na "École d'Horticulture Van Houte". Mas realmente a jardinagem não o atraia, numa época em que fervilhava na Europa, o interesse pelas nossas orquídeas e nossas plantas em geral, Pedro, com menos de 20 anos enxergou as perspectivas comerciais que o norteariam e faria seu enriquecimento, voltou ao Brasil e pôs-se a coletar orquídeas e plantas tropicais destinadas à exportação. Nesta época, a Bélgica era um dos países mais interessados em orquídeas e Pedro, conseguindo um empréstimo de um amigo belga da família, pois não havia conseguido nenhuma ajuda do pai, partiu em l870 com seu primeiro lote de plantas para a Bélgica. Assim foi fundado o Etablissement P.M. Binot.
Foi um sucesso, com esta primeira viagem conseguiu pagar o empréstimo e ainda ficar com bastante dinheiro para financiar a viagem seguinte. Fez nada menos que 76 travessias do Oceano Atlântico. Passava 6 meses no Brasil, 6 meses na Europa, levando e trazendo plantas. Enquanto estava aqui, fazia suas coletas e embalava ele mesmo as plantas, nas vésperas das viagens, passava noites em claro, à luz dos lampiões, velas e lamparinas. Introduziu a palmeira Coco weddeliana na Bélgica, uma paixão à primeira vista dos europeus. Dois exemplares que levou fizeram tanto sucesso que foram vendidos ao preço de 500 francos belgas, o que daria para se adquirir, atualmente, um automóvel usado. Pedro Binot conseguiu coisas fantásticas como levar uma palmeira de 4 metros de altura para uma exposição. Em outra ocasião levou uma Samambaia arborescente cuja touceira pesava 1.500 quilos. Ninguém sabe como conseguiu aquilo pois a tração era animal, as carroças eram puxadas por cavalos ou o transporte era feito no lombo dos burros até o cais do porto. A partir de l871, começou a exportação de sementes dessa palmeira que só foi interrompida pelas duas guerras mundiais. É longa a lista de plantas novas que introduziu na Europa e forneceu para o Jardim Botânico de Bruxelas, uma coleção inteira de plantas de valor botânico. Em reconhecimento às suas valiosas contribuições, foi condecorado pelo governo belga, como Cavaleiro da Ordem de Leopoldo.
Apesar do grande número de híbridos que começaram a ser feitos na Europa, o interesse pelas plantas nativas não arrefeceu e na verdade, era uma fonte de matéria prima para estas hibridações. No fim de sua vida, iniciou a construção das primeiras estufas e foi o responsável pela introdução no Brasil, de espécies sul-americanas de Cattleya, como a trianae, perciviliana, mossiae, algumas divisões delas são ainda hoje cultivadas.
Foi homenageado com a denominação de espécies da família das orquidáceas e de outras, como Marantha binotii, Lc binotii (híbrido natural entre Laelia pumila e Cattleya bicolor, Miltonia binotii, híbrido natural entre Miltonia candida e Miltonia regnellii.
Era uma pessoa que sempre estava fazendo algo, ora com um martelo, ora com um regador ou uma pena, com seu espírito aventureiro e empreendedor não podia ou não se dava ao luxo de ficar sem fazer nada. Era conhecido pela sua afabilidade e pela sua honestidade. Sempre muito alegre e simpático com os fregueses mas em sua vida privada era extremamente severo tanto com sua família quanto com seus empregados. Suas explosões de cólera era famosas mas passageiras. Apesar de seu temperamento e ocupação, encontrou espaço em sua vida para casar-se com uma prima viúva e já tinha um filho de nome Georges J. A. Verboonen. Desse casamento, teve um casal de filhos. Paradoxalmente, considerado boníssimo por quem o conhecia , não conseguiu ter um bom relacionamento com os filhos e não permitiu participação deles em sua firma enquanto viveu. Em 1911, ele morreu.
Georges H. A. Verboonen, pai do Jorge Verboonen, foi estagiar na Alemanha, Itália e Inglaterra. Com o falecimento de Pedro Maria Binot, voltou ao Brasil e tomou a direção, com seus irmãos, do orquidário e revezou-se na representação da firma em Bruxelas. Surpreendido pela eclosão da Primeira Guerra Mundial, quando estava em Bruxelas, conseguiu pegar o último trem de passageiros antes da ocupação alemã e foi para Inglaterra onde permaneceu por vários anos na firma Stuart Low e conheceu aquela que viria a ser sua esposa, Elizabeth May Robinson. Cansado de esperar pelo fim da guerra, retornou ao Brasil em l915. A eclosão da Primeira Guerra Mundial afetou muito as exportações porque o combustível para aquecer as estufas foi racionado, muitas delas foram fechadas e muitas coleções foram perdidas. Em conseqüência, as exportações foram suspensas. O Etablissement P. M. Binot, sofreu uma radical transformação e passando a ter como principal objetivo o fornecimento de flores para venda às lojas do Rio de Janeiro. Naquele época, vendia-se uma Cattleya warneri em flor por 500 réis. A Casa Flora absorvia quase toda a produção. Lenta e calmamente, as coisas foram progredindo, mais estufas foram construídas.
A partir de l921, começou a produzir os primeiros híbridos pelo método simbiótico dos quais apenas alguns exemplares eram cultivados pois o número de amadores ainda era muito reduzido. Datam desta época Bc Maronae, Lc. Bletchleyensis, C. Marielli, C. Mimoso e C. Minucia entre outros.
Poucos antes da 2a Guerra Mundial, foram importados os primeiros híbridos modernos que encantavam os visitantes e orquidófilos das primeiras exposições de orquídeas realizadas em São Paulo. A mais famosa foi a Brassocattleya Bambino nº 1. Hoje é comum ver-se albas em qualquer coleção entretanto, naquela época era uma sensação e eram vendidas a um conto e quinhentos. Só depois da 2a. Guerra é que surgiram a Bc. Ann Sladden, Bc. Francinette, Bc Laure Sladden, que fizeram sucesso por muitos anos.
Em 1945, o nome do estabelecimento foi mudado para Orquidário Binot Ltda e dedicou-se ainda mais à produção de flores, para atender uma demanda crescente do comércio especializado. Apesar de ter dado a seu filho Jorge Verboonen uma rígida educação européia, quando este manifestou a vontade de trabalhar no orquidário, Georges Verboonen colocou-o para executar os trabalhos mais humildes e simples como arrancar mato dos vasos e limpar as estufas. Aos poucos, Jorge foi aprendendo todos os segredos do cultivo das orquídeas e quando seu pai começou a ficar cego, praticamente assumiu a direção do estabelecimento, onde estava desde l940. O fim da vida de seu pai foi bastante doloroso pois para alguém que como ele, dedicou sua vida a produzir o belo, a cegueira foi um verdadeiro suplício. Com seu falecimento, a direção do orquidário foi entregue ele que iniciou um programa de ampliação das instalações já existentes e o cultivo de uma nova série de híbridos.
Em l960, o Orquidário Binot começou uma nova fase quando Rolf Altenburg, homem dinâmico e inovador, com quem Jorge tinha muito afinidade e considerava um amigo do peito, passou a sócio da firma, tendo dado um enorme impulso aos negócios. Jorge Verboonen considerava aquela uma feliz sociedade que muito o honrava. Ainda recentemente ficava muito emocionado quando falava de seu amigo. A partir daquela data, com a continuidade da expansão, o orquidário voltou a exportar orquídeas para a Europa, o que fez até l994, quando estas atividades foram suspensas.
Em l980, Rolf Altenburgh retirou-se espontaneamente da firma por achar que ela deveria continuar com a família Verboonen, numa atitude de nobreza de caráter.
Rolf Altenbourg homenageou seu amigo quando produziu, em l955, um híbrido (Potinara Creole x Lc. Gothaurea), e o batizou de Potinara Jorge Verboonen. Também em sua homenagem, um híbrido natural, cruzamento de Oncidium crispum X marshallianum foi nomeado Oncidium Jorge Verboonen assim como Binotia verboonenii. É interessante assinalar que, apesar das aparências, o nome de Binotia não foi dado em homenagem a Binot como nos explica o saudoso Padre José Gonzáles Raposo, em seu Dicionário Etimológico das orquídeas do Brasil. Para ele Binotia Rolfe, é um nome um tanto esquisito por primeiramente dar a impressão de ser formado de Binot, e segundo por ser um nome composto híbrido formado de: latim bin (dois) + grego ûs, otós (orelha). O nome seria uma alusão à forma do labelo cujo lobo mediano, da metade para a base, mostra duas saliências que podem dar a impressão de duas orelhas.
Com o despontar da orquidofilia no Brasil, Jorge Verboonen deu sua contribuição, incentivando as sociedades, comparecendo com suas plantas às exposições nas capitais e no interior. Como sócio da antiga SBO, em l999, concordou com a fusão com a OrquidaRio, permitindo assim que a sociedade adquirisse sua sede social.
Em l963, compareceu à IGA (Internacional Gartenbau-Austellung) em Hamburgo, Alemanha, levando uma seleção de espécies brasileiras, tendo conquistado o primeiro lugar com uma espetacular Sophronitis coccinea. Todas as planta expostas foram compradas pelo Jardim Botânico de Hamburgo.
Continuador da tradição do pioneiro Binot, introduziu no Brasil a Cattleya aurea e espécies botânicas de Masdevallia que ele tanto gostava.
Participou das Conferências Mundiais de Londres, Long Beach, Frankfurt, Meddlin, Bangkock, Durban e Miami, sendo conferencista convidado nesta última. Viajou aos Estados Unidos e Canadá para fazer palestras sobre as espécies brasileiras atendendo a pedido de sociedades locais.
Em suas freqüentes viagens, fazia questão de visitar os estabelecimentos de cultivo de orquídeas e em uma dessas viagens de 40 dias, visitou 37 deles, conforme anotado por Lourdes, sua esposa. Se era muito grande, passava, às vezes, o dia inteiro para ver tudo, se era menor, podia visitar até 3 ou 4 estabelecimentos
Dedicava uma parte de seu tempo ao estudo e frequentemente podia ser encontrado em sua biblioteca, absorto por completo na leitura .
Sob sua gestão, o Orquidário Binot se tornou uma referência tanto nacional como estrangeira. Apesar de introspectivo, atendia a todos que o procuravam. Colaborou com muitos pesquisadores brasileiros e estrangeiros (alemães, americanos, enfim de todas as nacionalidades). Diversos livros, nacionais ou estrangeiros, tiveram sua colaboração. Falava fluentemente francês e inglês o que facilitou muito seu contato com orquidófilos do mundo inteiro, entre os quais fez bastante amigos. Homem de poucas palavras, quando o assunto era orquídea se transformava e podia passar horas conversando sobre elas, sempre interessado em trocar experiências, em colaborar com taxonomistas e estudiosos nas descobertas e identificação de espécies novas. Pelo Orquidário Binot, passaram muitos estudiosos como Campacci, Denis Duveen, J.A.Fowlie, Lou Menezes, Francisco Miranda, Guido Pabst, Vitorino Paiva, Carl L. Withner, entre outros.
Seu filho, Maurício Ferreira Verboonen, Engenheiro Agrônomo, integrado ao orquidário desde l979, com muito dedicação, deu um novo impulso às atividades. As instalações foram remodeladas, foram adotados novos conceitos de irrigação e pesquisa para adoção de novas opções de substrato, em razão do xaxim encontrar-se em extinção. Seu trabalho foi motivo de orgulho para seu pai. Implantou um moderno laboratório para a propagação das orquídeas a partir da semente, já tendo sido produzidos vários híbridos e principalmente um grande número de espécies brasileiras, ameaçadas de extinção em seus habitats naturais.
O Orquidário Binot foi e continuará sendo na direção de seu Maurício, um celeiro para os pesquisadores das nossas espécies principalmente as de interesse botânico com a manutenção de sua reprodução. Ainda hoje é muito procurado pelos estudiosos da família das orquidáceas como Vitorino.
Maurício é a quarta geração da família que trabalha com orquídeas, que teve início em l870, no bairro de Retiro em Petrópolis. Fato bastante inusitado em nosso país.

 

Fontes consultadas:
Depoimento de: Maria de Lourdes Ferreira Verboonen (esposa)
Depoimento de: Maurício Ferreira Verboonen (filho)
Artigo publicado na Tribuna de Petrópolis, 30 e 31 de julho de l994 (Antonio Eugênio Taulois)
Catálogo do Orquidário Binot (90 anos de fundação - l960)
Artigo escrito por Maria de Lourdes Ferreira Verboonen e Maurício Ferreira Verboonen
Fotos: Arquivo da família e Sergio Araujo