(cont.)
Castanheira |
Planta adulta de Sumaúma |
Macucu (Aldina heterophylla) |
ON: Como é a distribuição das orquídeas na região amazônica, a maior parte delas ocorre sempre nas extremidades? PI:
Elas estão dispersas pela Amazônia: ocorrem nas copas
das árvores em igapós; na floresta de várzea;
nas áreas abertas e nas serras, tanto no escudo brasileiro,
quanto no das Guianas. |
ON:
O levantamento que você publicou no livro do 1º Encontro
de Orquidófilos pode ser considerado como um resumo do
trabalho que você fez na sua primeira fase no Amazonas?
Foi seu trabalho mais importante daquela época? ON: Você acha que a Amazônia ainda reserva muitas surpresas? PI: Até espécies não descritas estão sendo encontradas. Com uma maior divulgação das orquídeas aumentou o número os orquidófilos e dessa forma toda hora aparecem novas ocorrências para o Brasil. Em 1979, ministrei um curso em Boa Vista, Roraima e posteriormente foi criada a Sociedade de Orquidófilos de Roraima. É provável que na próxima caminhada, eu vá descobrir espécies não citadas para o Brasil ou novas para a ciência. |
ON:
Qual a Cattleya que mais ocorre na Amazônia, em termos
de número de indivíduos? PI: A Cattleya violacea. |
ON: Qual seria o principal gênero da Amazônia, seria o Catasetum? PI: Acho que sim, pois a Amazônia é muito rica neste gênero, tem muitas espécies de Catasetum. |
Catasetum
stenoglossum |
Catasetum
discolor |
Catasetum
barbatum |
ON: Qual a espécie de maior risco de extinção? PI: A que está tendo a maior vulnerabilidade à extinção, hoje em dia, na natureza (ela já está preservada em orquidários) é a Cattleya eldorado. Ela ocorre dos dois lados do Rio Negro, em torno da região de Manaus, Manacapuru e chega até Barcelos. Ocorre nas campinas e no igapó. Entretanto, a sua maior área de ocorrência, se dá no entorno de Manaus em campinas. Essas áreas de areia branca estão sendo destruídas para a extração de areia que é utilizada em obras, para plantar abacaxi e caju; ou porque criaram uma fábrica para fazer telas de cinescópios. Estão retirando caminhões e caminhões de areia. Dessa forma essas áreas vão, paulatinamente, sendo destruídas. |
Campina em condições naturais nas proximidades de Manaus |
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Campina
impactada nas proximidades de Manaus para a retirada de areia |
O INPA tem uma campina relativamente preservada que funciona como reserva biológica, entretanto, a derrubada da floresta para plantio, já está chegando próxima a ela. O Ibama também possui uma outra área de campina grande e preservada. Felizmente ainda existe muitas outras campinas na Amazônia brasileira. |
Orleanesia amazonica descrita originalmente do bairro da Ponta Negra na cidade de Manaus |
Para
se ter uma idéia, a Orleanesia amazonica foi descrita
originalmente do Município da cidade de Manaus, no bairro
da Ponta Negra. Hoje o local-tipo da sua descrição
está sendo todo destruído para a construção
de prédios. Isso é irreversível. Essa região está sobre pressão imobiliária, embora faça parte da Área de Proteção Ambiental do rio Negro (APA). Com referência à campina, orientei uma Dissertação sobre a Encyclia mapuera (antiga Encyclia tarumana), onde foi estudada a sua distribuição. Orientei outro Mestrado em “Fisiologia e Anatomia das Orquídeas da Campina”. No Doutorado estou orientando duas outras Teses que estão em andamento: uma sobre “A Distribuição da Cattleyas eldorado, em um Hectare da Floresta de Campina”, e a outra sobre “A Fisiologia e Anatomia |
das Orquídeas da Campina”, onde todos os parâmetros estão sendo medidos (ocorrência, em que altura, etc...). |
ON: E o problema do desmatamento de uma maneira geral? PI:
O Estado do Amazonas, com a implantação da Zona
Franca de Manaus, que possui uma indústria limpa, gera
poucos impactos e permanece, até hoje, como o mais conservado
dos estados da região norte. O desmatamento na região
está sendo feito em Rondônia, no Pará e recentemente,
em Roraima, começou uma fronteira agrícola. O que
está acontecendo é o seguinte: nos bordos da Amazônia
ocorre uma mata seca, com a sua derrubada o “efeito de borda”
(que altera os parâmetros de umidade e vento no interior
da floresta) tende a transformar a vegetação contígua
em mata seca, dessa forma futuramente os complexos vegetacionais
que ocorrem na região poderão ser comprometidos.
|
ON: Como é o seu trabalho que vem sendo desenvolvido junto à Petrobrás? PI: Todas as orquídeas que são coletadas são trazidas para que eu determine. Em 1977, recebi um financiamento da Petrobrás para o estudo das Orquídeas Epífitas no Campo Petrolífero do Urucu, Município de Coari, Amazonas. Tenho prestado diversas consultorias para a Petrobrás: em Urucu, no orquidário; no Tema Flora do EPIA/RIMA do Gasoduto Coari-Manaus. Como responsável técnico do licenciamento do desmatamento para a implantação do gasoduto, selecionei as áreas adequadas para depósitos dos dutos para a construção do mesmo, com o menor impacto ambiental possível; coordenei o programa de pré-comunicação do gasoduto, tema flora, identificando a ocorrência de espécies de árvores constantes da lista de espécies ameaçadas de extinção e protegidas de corte do IBAMA. Durante a obra do Gasoduto Coari-Manaus, irei coordenar a equipe que vai fazer o salvamento das orquídeas e epífitas, que serão incorporadas ao orquidário do Urucu. Adicionalmente, dentro da sua Política de Desenvolvimento Sustentável, a Petrobrás em convênio com a Universidade Federal do Amazonas (UFAM), através do Centro de Ciências do Meio Ambiente (CCA), vem desenvolvendo um projeto de pesquisa abrangente e multidisciplinar denominado PIATAM - Possíveis Impactos Ambientais no Transporte de Gás e Petróleo - que engloba a calha do rio Solimões, em estações de coletas predeterminadas nas fases de cheia e vazante, desde os Municípios de Coari até Manaus. O referido projeto, que já está no início da quarta fase, está sendo consolidado num programa de monitoramento ambiental permanente, com a finalidade de produção de pesquisas e diagnósticos ambientais que ajudem a empresa a lidar com possíveis impactos advindos do transporte dos derivados de petróleo no referido rio e no seu entorno. Isto já está sendo estudado há 10 anos. São quatro excursões por ano no total, num raio de 60 km na bacia. A cada dia a gente pernoita numa comunidade. Tenho caracterizado e produzido mapas temáticos da vegetação, através do geoprocessamento. Estou, na medida do possível, fazendo anotações sobre o local de ocorrência das orquídeas e, sempre que posso, as coleto, prenso e fotografo. |
Mapa
temático da flora, com a indicação do traçado
do projeto do gasoduto Coari-Manaus e dos pontos de coleta do
PIATAM |
Classificação
fitoecológica das tipologias vegetacionais que ocorrem
na área do traçado do projeto do gasoduto Coari-Manaus |
Orquídeas
que ocorrem ao longo do traçado do projeto do gasoduto
Coari-Manaus |
Oncidium cebolleta (área de várzea) |
Oncidium lanceanum (área de terra firme) |
Cattleya luteola (área de várzea) |
Cattleya violacea |
Cattleya eldorado |
Rodriguezia lanceolata |
ON: Quais são os objetivos específicos deste projeto? PI: São vários os objetivos. O do Tema Flora é o mapeamento e caracterização das tipologias vegetacionais, identificação das macrófitas aquáticas e das plantas ribeirinhas, coleta e identificação das espécies nos diversos ambientes, verificação do status de conservação da vegetação, identificação de forófitos e suas epífitas, utilização das epífitas como indicador de conservação de habitat, produção de listagem de espécies por habitat e sua importância econômica, descrição das síndromes de polinização e dispersão de frutos. ON: Como funciona o EPIA-RIMA? ON: Para qualquer obra que vai ter impacto ambiental, deve ser feito um estudo prévio e um relatório de impacto ambiental, submetidos a audiências públicas, para a obtenção da licença da obra, a ser emitida pelo órgão competente. A obra do gasoduto já foi licenciada. Obteve-se, também, o licenciamento para fazer as clareiras para os depósitos de dutos, porque os mesmos serão transportados por balsas na época das cheias até as clareiras próximas à linha do gasoduto, em locais onde o barco possa chegar. Estavam previstos 49 hectares de floresta para serem cortados. Com a ida a campo conseguimos reduzir para 4,5 hectares da área de floresta virgem a ser cortada. Aproveitamos áreas degradadas já existentes para servir como depósitos de dutos (capoeira, campo de futebol, pasto, roça, etc.). Tudo isso foi negociado com as comunidades que serão devidamente indenizadas. Durante e no final da obra, as áreas impactadas serão recompostas. Também será refeito em outro local o campo de futebol. Recentemente, finalizamos o programa de licenciamento para o desmatamento e a primeira fase do programa de pré-comunicação da obra do gasoduto. Desde agosto, estamos indo a campo todos os meses, com intuito de chegar à diretriz do gasoduto, que é uma diretriz teórica. Só por GPS é que nós sabemos se estamos no local do traçado. Para se conseguir isso, o transporte básico é a canoa. Quando não tem rio próximo, temos de fazer caminhada e, às vezes, atravessar locais encharcados com a água até no meio das pernas. |
Pedro Ivo com membros da equipe da UFAM e da Petrobrás, fazendo observações de campo ao longo da diretriz do projeto do gasoduto Coari-Manaus |
ON: Qual será a extensão deste gasoduto? E qual a largura que ele vai ocupar na floresta? PI:
São 393,8 km e 15m de largura. Depois da obra pronta permanecerá
apenas uma faixa de 5m com vegetação rasteira. Os dutos
serão enterrados a 2m e meio de profundidade. No projeto inicial,
o trajeto passava por uma parte expressiva de várzea e por uma
área enorme de campina, uma área de ocorrência de
muitas orquídeas. Sugeri a mudança do traçado,
o que foi acatado pelos engenheiros da Petrobras. Atualmente a maior
parte do traçado está alocada em terra firme para evitar
problemas com os estoques de peixe. Quando ocorrer a travessia de corpos
d’água, a técnica empregada será a do furo
direcional. Por exemplo, passando por baixo do rio Solimões a
28m de profundidade. Essa técnica é semelhante a que foi
utilizada no túnel do canal da Mancha, ligando à Inglaterra
a França. Com essa tecnologia, a Petrobrás consegue perfurar
ate cerca de 2 km. Os seus técnicos fazem isso comumente na Bacia
de Campos. No furo direcional, a broca entra na posição
inclinada, depois vão sendo colocados os dutos e concretados.
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ON: Este projeto está em que fase agora? PI: Agora vai iniciar a fase do desmatamento. Antes do seu início vai ocorrer uma preventiva ambiental. Toda árvore que está na lista de espécies ameaçadas de extinção não poderão ser cortadas, são 6 ou 7 espécies, como listado na tabela a seguir. As orquídeas, bromélias e também outras plantas epífitas serão coletadas para o orquidário de Urucu e para Universidade Federal do Amazonas. Espécies incluídas na lista de plantas protegidas do IBAMA que serão preservadas na preventiva ambiental para a implantação do gasoduto. |
NOME
CIENTÍFICO |
FAMÍLIA |
NOME
VULGAR |
AMBIENTE |
CATEGORIA |
Aniba rosaeodora Ducke | Lauraceae | Pau-rosa | Terra firme | Em perigo (E) |
Bertholletia excelsa Bonpl. | Lecythidaceae | Castanha do Brasil | Terra firme | Vulnerável (V); |
Bowdichia nitida Spruce ex Benth. | Leguminosae | Sucupira-preta | Terra firme | Vulnerável (V); |
Hymenaea courbaril L. | Leguminosae | Jatobá | Terra firme | Em perigo (E) |
Pithecellobium racemosum Ducke | Leguminosae | Angelim-rajado | Terra firme | Vulnerável (V); |
Virola surinamensis (Rol. Ex Rottb) Warb. | Myristicaceae | Ucuúba | Várzea | Vulnerável (V); |
Vouacapoua pallidior Ducke | Leguminosae | Acapu | Terra firme | Em perigo (E) |
ON: Depois de pronto, já que ele fica subterrâneo, a possibilidade de regeneração da floresta é grande? PI: É lógico que sim. O impacto gerado na floresta é mínimo e transitório. O primeiro trecho de Urucu até Coari já está totalmente regenerado, você nem percebe que houve o corte da floresta. Inicialmente são cortados quinze metros e ao final da obra permanece apenas uma faixa de 5 metros com vegetação de pequeno porte. Para não impedir a passagem dos animais, de um lado para outro, na diretriz do gasoduto está prevista, a cada 10 km, a construção de “pontes verdes”. As raízes das árvores na Amazônia crescem nas camadas mais superficiais do solo. No máximo a 2-3m de profundidade, porque o solo é muito rico em alumínio, que é tóxico para as plantas. Quanto mais profundo, existe uma maior concentração desse mineral, por isso as árvores aqui da região não possuem raízes pivotantes. Quando uma árvore cai, isso pode ser facilmente observado. Nas áreas de “ponte verde”, o solo será levantado e o duto será enterrado mais profundo e concretado. Dessa forma será evitado o risco das raízes da vegetação a ser replantada perfurar o mesmo. Para um projeto ser liberado, é preciso saber as espécies que ocorrem, o que deve ser preservado, o que não pode ser cortado. Para se obter a licença, tem que se ter toda a argumentação necessária. |
Fotos:
Pedro Ivo Soares Braga
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