Jayr Fregona Júnior é capixaba, cirurgião plástico orquidófilo e colecionador de moedas.
Criou e mantêm o site Orkideas (http://www.orkideas.com.br) além de uma lista de discussão do mesmo nome.
Em sua homenagem, Lou Menezes descreveu o híbrido natural entre Brassavola tuberculata e Cattleya guttata, sob o nome de Brassocattleya fregoniana



ON: Jayr, por que começou a cultivar orquídeas? Houve um momento mágico da atração?
JF: Meu primeiro contato com as orquídeas foi em 1980, quando um amigo de escola, Gilmar L. Pimentel (que também colecionava moedas), convidou-me para procurar orquídeas nas margens das lagoas de Linhares, pois meu pai tinha um barco e precisava de um para poder andar mais facilmente. Embora eu tenha ido e não tenha encontrado nada, ganhei algumas plantas. Elas foram plantadas em árvores no sítio e lá ficaram sem que eu tivesse interesse nelas, assim não foi desta vez.
Em 1990, já na faculdade, outro amigo, Fernando Gil, convidou-me para ver as moedas que o pai tinha e lá, após ficar "babando" nas moedas que estavam largadas (quando fui olhar, o pai “voltou” a colecionar), sentamos na varanda de frente para o orquidário. Ele me pediu que quando fosse pescar na Bahia, procurasse uma orquídea para ele e me “orientou” como era. Assim, em minha primeira pescaria, após 4 dias dentro do rio Peruipe (Ba), olhando pra todas as árvores e vendo “milhares” de orquídeas (que hoje sei serem bromélias) encontrei uma que devia ser uma orquídea com 2 botões. Ela estava em local baixo, foi só encostar e logo estava no barco a caminho de casa. Quando cheguei em casa, pensei: “Dizem que a flor das orquídeas é exótica, então vou ver esta flor antes de entregar a planta ao Fernando”. Encostei a planta num canto, na forquilha de uma árvore, e passei a olhar todos os dias esperando que abrisse o botão. Após 15 dias ansiosos de espera, pensei comigo: “Deve ser muito exótica mesmo, pois já passaram 15 dias e ainda não abriram”. A espera continuou e nada das danadas abrirem, mais 15 dias e surge uma dúvida: “Será que estas danadas abrem de noite e fecham de dia?”. Algumas noites, em horários alternados, fui ver se pegava a danada desprevenida e nada, ela continuava impassível, com os dois botões verdes sem abrir. Então o interesse foi diminuindo, até que esqueci a planta lá. Certo dia, meu pai, que também nunca tinha ouvido falar de orquídeas, me falou: "Você viu que a planta que trouxe da Bahia? está soltando sementes". Foi aí que cresceram as orelhas de burro e se acendeu a chama de orquidófilo. Corri lá e vi um pó fino, peguei, corri para o laboratório, olhei no microscópio (na época eu trabalhava como laboratorista na clínica) e lá vi sementes nucleadas. Depois disto lá vem o pensamento de novo: “Vou ver como planto isto e vou dar para o Fernando um monte desta planta, ao invés de levar só uma”. Nesta mesma sexta feira comprei o livro "O cultivo de Orquídeas no Brasil", de Waldemar da Silva. No final de semana, tinha lido 3 vezes e na segunda feira estava apto a fazer a semeadura.
Na semeadura, os fungos foram os problemas e o que me entristeceu foi ver que, após 8 meses de tentativas, nos vidros ou nasciam fungos ou não germinava e no xaxim onde eu jogava os restos das sementes as plantinhas já tinham 2 cm de comprimento.
Bem, vamos parar por aqui, pois senão ninguém agüenta ler. Só completando, dei a planta para meu amigo e comecei a ganhar muitas outras de orquidófilos, além de pedidos para tentar semear as plantas deles.

ON: Além deste, houve algum outro fator de influência (pessoa ou fato) na sua relação com as orquídeas?
JF: Pessoas que posso relacionar, além destas: Éledio Braz Dalmaschio, grande amigo e incentivador; Wladyslaw Zaslawski, grande amigo e professor em tudo que foi preciso; Auceu Berger, amigo e orientador sobre cultivo e genética.

ON: Há quantos anos você cultiva orquídeas?
JF: Cultivar mesmo tem uns 12 anos.

ON: Quantas plantas você possui, aproximadamente?
JF: Ultimamente tenho até diminuído muito as plantas, pois o tempo está escasso. Embora nunca tenha contado as mesmas acredito que devo ter perto de 2000 plantas adultas e outro tanto entre frascos e “filhotes”.

ON: Quanto tempo, por dia, você gasta cuidando de suas orquídeas?
JF: Conforme eu disse, hoje o tempo está escasso e estou com uma pessoa cuidando delas, mas nos finais de semana passo algum tempo com elas.

ON: Você tem preferência por híbridos ou por espécies? Por que?
JF: Tenho preferência por espécies, por ser algo mais limitado. Como colecionador eu acredito que tenha que ter um objetivo e se pensar que, embora distante, espécie é algo mais definido do que híbridos, que podem ser infinitos.

ON: Entre suas plantas, existe alguma que seja a preferida?
JF: Existem muitas preferidas, como a Cattleya walkeriana semi alba “Corpus Chisthi”; Laelia crispa estriata “Baronesa”; C. warneri semi alba “Jayr Fregona”.

Cattleya walkeriana semi alba “Corpus Chisthi”

ON: Quais são as condições climáticas encontradas em seu ambiente de cultivo?
JF: Clima quente, a nível do mar.


Cattleya nobilior amaliae

ON: Você teria alguma dica de cultivo sua que quisesse compartilhar conosco?
JF: As plantas necessitam de adubo para viverem dentro de um vaso ou cachepot. Assim seja rigoroso com isto e terá plantas bonitas. Quanto à semeadura, vou repetir o que me foi dito pelo Wladyslaw em nosso primeiro encontro: “Jayr, a semeadura é simples, mas tem de fazer certo para dar certo, não pode tentar improvisar ou mudar as fórmulas que maior é a chance de dar errado.”

ON: Existe alguma história ou caso interessante ligado à sua relação com as orquídeas?
JF: Muitas histórias existem... Um dia comprei muitas plantas em um vendedor e, como bônus, ganhei uma muda de um cruzamento relativamente comum. Após algum tempo, a muda floriu e era uma C. warneri semi alba lindíssima, diferente de todas que eu já tinha visto. Ao comentar com o vendedor ele me disse: "Você tem muita sorte, pois neste cruzamento não abriu nada bom, somente esta planta que você está me mostrando agora. E olha que já abriram muitas plantas dele".

ON: Você tem seu nome em um híbrido natural descrito para o Espírito Santo. Como você encontrou esta planta?
JF: O híbrido natural entre C. guttata x Brassavola tuberculata foi descrito pela L.C. Menezes como sendo Bc fregoniana, existe, porém quem acredita que este híbrido seja o mesmo que Bc. Tramandahy - de C. tigrina (ex-leopoldii) x Brassavola tuberculata, que foi descrito antes. Eu mesmo não sei o que pensar, pois se considerarmos que a C. guttat é uma espécie diferente da C. tigrina (ex-leopoldii), temos que considerar como um híbrido diferente, mas se considerarmos que a C. guttat é a mesma espécie que a C. tigrina (ex-leopoldii), aí sim teremos somente um híbrido, mas qual seria? O que foi descrito primeiro ou o que foi descrito da espécie mais antiga? Pois se for a mesma espécie, a C. tigrina (ex-leopoldii) deixa de existir e passa tudo ser C. guttat, que é o mais antigo termo descrito. Então não sei como seria considerado, mas deixo isto para os botânicos.
O ocorrido em relação a esta planta foi o seguinte: em 1992 ,meu amigo Fernando, disse que a L.C. Menezes estava procurando uma planta que seria um híbrido natural entre Cattleya guttat e Brassavola e nós resolvemos procurar o danado, para mandar para ela. Rodamos boa parte de Vitória e nada encontramos, mas, vários anos depois, em caminhada junto com o Elédio, encontrei a planta, retiramos 3 mudas e uma delas mandei para a L.C. Menezes, que resolveu me prestigiar colocando meu sobrenome na espécie. Nunca esperei que isto acontecesse, mas aconteceu.


Cattleya nobilior amaliae

ON: Diz-se que a orquidofilia é uma manifestação branda de loucura. Você já fez alguma loucura orquidófila?
JF: Sim, uma vez tinha uma ida marcada a uma habitat, ainda desconhecido, com 3 amigos, era uma viagem longa, cerca de 400 km de asfalto e 180 km de chão. Tudo marcado para sexta feira, iríamos em meu Monza com 6000 km rodados, ou seja, zerinho, conhecer o habitat, por indicação de outros amigos. (Aqui devo dizer que minha experiência em direção era exatamente a do velocímetro deste carro, que comprei zero e foi retirado da concessionária por um amigo e só depois eu reaprendi a dirigir, pois tinha feito auto escola e tirado carteira há 5 anos e nunca mais entrei em um carro). Na sexta feira cedo, 2 dos amigos cancelaram e o terceiro cancelou na hora de sair, já com o carro na porta da casa dele. Eu, muito tranqüilamente, fui.
Foi tudo bem, os 400 km de asfalto foram vencidos muito tranqüilamente, com uma boa música no som. Na estrada de chão as coisas pioraram um pouco. Por volta dos 9 km, o carro derrapou, bateu no barranco e virou de rodas pra cima. Ainda bem que eu sempre usei cinto de segurança, saí do carro, olhei para o mesmo e pensei: “Não querem que eu chegue neste habitat mesmo, ainda bem que está no seguro”. Após a chegada da polícia, foi feita a perícia e o carro foi para a delegacia, onde também fiquei esperando o ônibus para voltar no final do outro dia,  pois tinha um por dia. Avisei a concessionária que tinha tido um problema e também avisei em casa. Ao contar para minha mãe, falei: "Mãe, eu bati com o carro e estou no hotel pra esperar o ônibus para casa". Descrevi a batida: “Mãe, o carro derrapou e bateu no barranco e virou de rodas pra cima.” E ela com toda a sapiência do mundo: “Você capotou com o carro ???”. Depois de desligar, ela ligou para o hotel para conferir se eu estava lá mesmo e não em um hospital. Coisa de mãe...
Quando o carro chegou na concessionária, o vendedor me ligou e disse que o problema era um pouco maior do que ele imaginava e que era perda total do carro.
Só pra encerrar, eu tentei de tudo para os policiais me levarem para frente ou me encontrarem um carro pra alugar, mas eles não me ouviam. Então, tive que voltar pra casa sem conhecer o habitat.

ON: Você gostaria de acrescentar alguma coisa?
JF: Sim, eu gostaria de deixar aqui um ponto de vista que há muito tempo me acompanha. As orquídeas são apenas um pretexto, sim, as orquídeas são uma grande desculpa para que possamos ter, compartilhar e encontrar freqüentemente amigos.
Em exposições, o que está sendo exposto são as pessoas e não as plantas. Já pararam para pensar quantas vezes ouviram ou perguntaram: “O fulano não veio ou não vem a esta exposição” (ninguém pergunta se a planta tal não veio nesta exposição). Por isso cultive mais seus amigos do que suas plantas, embora elas sejam amadas, no fundo, porque elas nos trazem amigos.



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