Introdução
O gênero Myoxanthus Poeppig & Endlicher teve uma história
movimentada. Logo após seu estabelecimento, em 1835, para a espécie
Myoxanthus monophyllus (Colômbia, Equador, Peru), este último
táxon foi, quase que imediatamente, transferido por Lindley para
o gênero Pleurothallis R. Brown. Mais tarde, Karsten descreveu
uma espécie sob o nome de Duboisia reymondi (Colômbia,
Equador, Venezuela), hoje Myoxanthus reymondii. Seis anos depois,
Reichenbach a transferiu também para o gênero Pleurothallis.
Em 1882, Barbosa Rodrigues descreveu sob uma espécie sob nome de
Chaetocephala punctata (hoje em dia, Myoxanthus punctatus)
que foi, por sua vez, transferido por Cogniaux para Pleurothallis.
Na verdade, foi Carl Luer que, em 1982, dentro de sua monumental obra
sobre Pleurothallidinae, ressuscitou o gênero agrupando 38
espécies conhecidas até aquela data, às quais se
juntou uma dezena de espécies mais recentemente descobertas. São
habitantes típicos de floresta tropical densa, com uma distribuição
geográfica bipolar, estando a maior parte das espécies encontradas
entre a Bolívia e o México com uma pequena extensão
em direção à Venezuela e às Guianas, enquanto
um grupo pequeno (8 espécies) é brasileiro. No Espírito
Santo, polo de diversidade biológica, há, atualmente, 5
espécies registradas, entre elas, Myoxanthus ruschii C.N.
de Fraga & L.J.C. Kollmann, descrita em 2003.
A descoberta de uma nova espécie não é, deste modo,
uma coisa totalmente improvável e esta apresentada aqui foi descoberta
por Nelson Sanson, um amador muito observador e competente de Conceição
do Castelo que percorre incansavelmente aquelas poucas florestas que resistem
dentro do seu município, situado na parte relativamente baixa das
montanhas do Espírito Santo. Esta espécie se distingue das
outras, antes de tudo, por seu tamanho pequeno e nesta característica
se compara ao Myoxanthus ruschii, mas se distingue sobretudo das
outras espécies conhecidas do gênero pelo colorido violeta
de suas flores, enquanto que a cor castanha, na falta do branco, parece
ser a regra do gênero.
Planta herbacea, epiphyta, in genere parva, Myoxanthus lonchophyllus,
punctatus vel seidelii affinis sed manifeste minor, folia maxime 10 cm
longa cum marginibus nervo medianoque atropurpureis, floribus fasciculatis
succedaneis nutantibus et lilaceis, labello 5,5 mm longo, 2 mm lato, antice
canaliculato, postice cum marginibus recurvatis,saccum sphaericum atropurpureum
nitensque formantibus, columna 3,5 mm longa, recta, pede mentum 1,5 mm
formante, rosacea 5-plo roseolineataque.
Tipo
: Brasil, Espírito Santo, Conceição do Castelo, Cachoeira
da Fumaça, latitude 20° 22’ 40’’ S, longitude
41° 15’ 00’’ W, altitude 620 m, junho 2003 (flores),
Nelson Sanson s.n. ex M. Frey 531 (Holótipo: MBML, Isótipo
: M. Frey 531 : LY, mesma planta).
Descrição
Planta herbácea, epífita de floresta, ereta, com altura
de 15-18 (20) cm. Rizoma cilíndrico, diâmetro de 3
mm, ligeiramente rampante (3-6 mm entre ramicaules), recoberta de bainhas
híspidas ; raízes marrom-amareladas, até 10 cm de
comprimento, com, aproximadamente, 1 mm de espessura; ramicaules
eretos, 4-8 cm de altura, 1,2 mm de espessura, 4-articulados, recobertos
de bainhas imbricadas guarnecidas de tricomas marrons ; folha ereta,
coriácea, com 7-10 cm de comprimento, largura de 9-10 mm, espessura
de 2 mm, estreitamente lanceolada, base cuneiforme, extremidade aguda,
verde oliva com margens e nervuras central purpúreas, glabra, margens
lisas ; inflorescência emergindo de uma espata mínima,
composta de flores fasciculadas sucessivas, geralmente uma, às
vezes, 2 ao mesmo tempo ; bráctea muito pequena, pedúnculo
de 12-15 mm de comprimento, filiforme, pendente, glabro, ligeiramente
purpúreo; pedicelo com 2 mm de comprimento; ovário com comprimento
de 3 mm e diâmetro de 0,6-0,8 mm ; flor nutante, cor geral
rosa lilás; sépala dorsal com comprimento de 8 mm,
largura de 3 mm, obovalada, convexa, de extremidade obtusa, glabra, margens
lisas e ligeiramente recurvadas, rosa claro translúcidas com 5
linhas longitudinais púrpuro-escuras ; sépalas laterais
soldadas até 2/3, com comprimento de 8 mm, largura de 3 mm, ovais,
convexas, extremidade retangular e apiculada, glabras, margens lisas,
mesma cor da dorsal ; pétalas com comprimento de 8,5-9 mm,
com largura de 1 mm, filiformes et retas, com a base um pouco alargada
e a extremidade espessa, rosa-claro translúcida com 3 linhas longitudinais
em púrpura escuro e margens recurvadas em direção
ao meio, extremidade rosa- violeta ; labelo com comprimento de
5,5 mm, largura de 2 mm, a princípio caniculado, depois as margens
se recurvam para formar uma bolsa esférica brilhante púrpura-escura,
embaixo rosado com linhas púrpuro-escuras ; coluna com 3,5
mm de comprimento, 1,5 mm de largura, reta, o pé formando um mento
de 1,5 mm, as laterais formando asas pouco salientes, rosas-claro e estriadas
de 5 linhas rosas mais escuras; antera amarelo-enxofre. Ver desenhos
1 e fotografia.
Fig. 1
: Myoxanthus conceiçoensis M. Frey & N. Sanson
A : planta – B & C : flor – D : segmentos florais
– E : coluna e labelo
F : labelo– G : entera - H : polínias
desenho de Josiene Rossini a partir do tipo |
Etimologia
O nome específico é uma homenagem ao Município de
Conceição do Castelo, onde a planta foi descoberta e também
cidade natal de Nelson Sanson.
Habitat
e distribuição geográfica
Myoxanthus conceiçoensis foi encontrada no ano de 2003,
por Nelson Sanson, morador de Conceição do Castelo e atento
conhecedor das orquídeas da região, numa pequena área
remanescente de floresta tropical densa, em uma das relíquias de
Mata Atlântica que ainda resistem na região, às margens
do Rio São João de Viçosa, no local conhecido como
Cachoeira da Fumaça. A planta se mantinha no tronco de uma arvore
a uma altura de aproximadamente 3 metros do solo. Há informações
de que ela seja também conhecida no norte do estado do Espírito
Santo (Pedro Canário) e mais perto da capital, Vitória.
O Herbário do Museu de Biologia Mello Leitão em Santa Teresa
guarda em seu acervo a exsicata de uma planta coletada no ano de 1986,
por Hélio Q. B. Fernandes, na Fazenda São Joaquim no citado
município. Na oportunidade, não foi totalmente identificada
e que agora é considerada Myoxanthus conceiçoensis.
Essa planta é rara na região. As condições
climáticas do lugar são: medianamente quente, devido à
altitude de 620 m, úmido sem excesso, bastante sombreado. Sua floração
principal ocorre em junho, ou seja, princípio do inverno, mas parece
ser capaz de florir de tempos em tempos, fora deste período.
Discussão
As espécies com as quais se justifica uma comparação
são Myoxanthus lonchophyllus, Myoxanthus punctatus
e Myoxanthus seidelii. Myoxanthus conceiçoensis se
distingue das espécies citadas por seu porte pequeno raramente
ultrapassando 18 cm, enquanto que as três primeiras são grandes
(altura das plantas adultas: 25 à 40 cm). As folhas de M. seidelii
são resistentes e coriáceas, com uma largura que atinge
2,5cm e não são arroxeadas, enquanto
que das do M. conceiçoensis raramente atinge 1 cm, além
de serem verdes com margens e nervura central arroxeadas. Suas flores
apresentam as sépalas e pétalas na cor rosa claro, quase
translúcidas, com 3 linhas de pontos roxo-escuro transmitindo a
impressão de cor lilás. A
extremidade do labelo forma uma bola hemisférica lisa e brilhante,
roxa escura, o que diferencia esta planta definitivamente das espécies
vizinhas onde o labelo é mais ou menos verrugoso como no Myoxanthus
lonchophyllus (Barbosa Rodrigues) Luer (labelo com ápice «
hispid-papillose » seg. Luer), no Myoxanthus punctatus (Barbosa
Rodrigues) Luer (labelo verrugoso seg. Luer) ou no Myoxanthus seidelii
(Pabst) Luer (labelo com ápice “spiculato-verrucose”
seg. Luer). As
demais espécies do gênero encontradas no Brasil austro-oriental
têm flores geralmente de cor marrom, algumas com um pouco de amarelo
ou de verde. As flores de M. lonchophyllus são marrom-amareladas
pintalgada de púrpura. As de M. punctatus são verde-garrafa
com pintalgado púrpura e um
labelo púrpura claro na base e púrpura escuro em sua extremidade.
Uma variedade bastante dispersa é mais marrom. As flores de M.
seidelii são verdes e marrons, com pétalas brancas amareladas
e o labelo é amarelo-alaranjado. Além disto, as flores das
três espécies em comparação são grandes
[sépalas 9-10 mm × 4-5 (7) mm enquanto que as desta espécie
medem 8 × 3 mm].
Bibliografia
utilizada pelos autores
- Barbosa Rodrigues, J., 1996. Iconographie des orchidées du Brésil,
Vol I, pp 188 & 189, Friedrich Reinhardt Verlag, Basle.
- de Fraga, C.N. & L.J.-C. Kollmann, 2003. Myoxanthus ruschii
(Orchidaceae) uma nova espécie da Mata Atlântica, Espírito
Santo, Novon : A Journal for Botanical Nomenclature :Vol 13, N° 1,
pp 49-51.
- Luer, C.A., 1992, 1997. Icones Pleurothallidinarum : Vol IX, Systematics
of Myoxanthus, pp 52 & 53 , 74 & 75, Vol XV, Systematics
of Trichosalpinx, pp 132,134 & 135, Missouri Botanical Garden.
Agradecimentos
dos autores
A Nelson Sanson que descobriu essa planta no ano de 2003 e que, desde
então, a cultiva cuidadosamente, permitindo que fossem observações
em excelentes condições.
A Carl Luer que, pelos avisos e conselhos preciosos, ajudou muito confirmar
a novidade desta planta.
A Claudio Nicoletti de Fraga e Ludovic J. Charles Kollmann que, tendo
conhecido a exsicata do Museu de Biologia Melo Leitão, incentivou
a descrição desta espécie.
A Josiene Rossini por ter feito um desenho de ótima qualidade,
mesmo em condições um tanto desfavoráveis.
Agradecimento de Brazilian Orchids & Orchid News
A Guy Chiron, editor da revista Richardiana, por cedido gentilmente
os arquivos e fotos para este trabalho, assim como a autorização
para a sua reprodução.
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