LEPTOTES
VELLOZICOLA:
Uma espécie de Orchidaceae recém- descoberta
originária da Bahia
Neodiver. 1:1-5
C.
VAN DEN BERG1, E. C. SMIDT1 AND
S. MARÇAL2
1Laboratório
de Sistemática Molecular de Plantas, Universidade
Estadual de Feira de Santana,
BR 116, Km 3, 44031-460, Feira de Santana, Bahia, Brasil
2Rua Aníbal Bittencourt, 345, 45615-000, Buerarema,
Bahia, Brasil |
Resumo
Uma espécie de Leptotes
recentemente descoberta para o estado da Bahia, Leptotes
vellozicolla Van den
Berg, E.C.Smidt & Marçal, é descrita
e ilustrada. É somente conhecida para a Chapada Diamantina, Bahia,
crescendo como epífita em Vellozia
sp. (Velloziaceae).
O
gênero Leptotes foi originalmente
descrito por Lindley (1853), que cunhou o nome a partir da palavra grega leptos,
que significa tenro ou estreito, baseado
na delicada aparência de suas partes florais e folhas. No conceito
original, o gênero era caracterizado por ser epífita, pequeno,
plantas cespitosas, rizomas cilíndricos inconspícuos, pseudobulbos
unifoliados menores do que as folhas
cilíndricas, carnosas e caniculadas. A inflorescência é pequena em racimo de 1 a
5 flores, com flores grandes em relação às plantas, pétalas e
sépalas estreitas e similares e labelo trilobado.
O polinário é quase único em Laeliinae,
com 3 pares de polínias,
sendo uma grande e as duas outras pequenas. Tal morfologia de
polinário é somente encontrada
no gênero monótipo Loefgrenianthus, cuja única espécie foi descrita originalmente
como Leptotes.
Dados moleculares (van den Berg et
al. 2000) mostraram que Loefgrenianthus
é próximo do grupo com todas as espécies de Leptotes,
e poderia possivelmente ser incluído neste último, como originalmente
descrito por Löfgren (1918). Bentham
(1881) sinonimizou Leptotes sob Tetramicra, apesar do fato deste último carregar dois
pares de polínias. Cogniaux
(1902) restabeleceu Leptotes
e listou então cinco espécies e três variedades. A primeira revisão
exclusiva do gênero foi publicada por Krackowizer
(1954a,b), onde ele listrou 11 espécies, ocorrendo do Espírito
Santo ao Rio Grande do Sul , no Brasil e estendendo até o leste
do Paraguai. Entretanto, no clássico “checklist” das orquídeas brasileiras
incluído por Pabst
& Dungs (1975), eles adotaram somente três espécies e quatro
sinônimos, Withner (1993) adotou cinco
espécies mas omitiu os
outro seis nomes do gênero validamente publicados, não deixando
claro se considerava como sinônimos ou como espécies obscuras.
De acordo com a análise filogenética molecular baseada nos dados
obtidos a partir das seqüências ITS DNA (van
den Berg et al. 2000), Leptotes pertence
a clade basal em Laeliinae que inclui Constantia, Isabelia
e Pseudolaelia. Este clade
engloba diversos gêneros que são nativos do sudeste e sul do Brasil
e são, geralmente, plantas pequenas, a maioria crescendo em Velloziaceae
ou na rocha, ou pequenas árvores, associadas, principalmente,
à vegetação dos campos rupestres. O novo gênero Adamantinia
também pertence a este clade (van den
Berg, dados moleculares não publicados). Ao contrário dos outros
membros deste clade, Leptotes ocorre
principalmente em áreas úmidas dos domínios da Mata Atlântica.
Pabst &
Dungs (1975) listaram somente L.
bicolor Lindl. para o estado da Bahia. Recentemente, duas
novas espécies foram descritas, L.
bonhkiana Campacci (Campacci 2005) e L. pohlitinocoi V.P.Castro & Chiron
(Castro Neto & Chiron 2004). Estas
novas espécies ocorrem na Mata Atlântica próxima do litoral do
sul da Bahia. Elas apresentam morfologia floral muito similar
mas confrontam-se nas diferenças de tamanho em suas partes vegetativas
e florais, sendo provavelmente relacionada ao L. unicolor
Barb.Rodr. Em recente trabalho de campo na parte central do
estado, nós encontramos uma outra nova espécie que parece mais
relacionada ao L. pauloensis Hoehne do que as duas novas espécies da costa.
Ela ocorre na região da Chapada
Diamantina que é conhecida
por possuir uma flora muito particular e diversa e que revelou
diversas novas espécies (e.g. Smidt
& Toscano de Brito 2004) ou ainda novos gêneros como Adamantinia
(van den Berg & Gonçalves 2004).
.
Leptotes vellozicola
Van den Berg, E.C.Smidt & Marçal, Neodiver. 1:1-5 Type
BRASIL. Bahia: Chapada Diamantina, 30 Oct 2005, E.C. Smidt,
C. van den Berg, & S. Marçal 650 (Holotype: HUEFS!).
Figs. 1, 2.
Haec species
L. tenui et praesertim L. pauloensi similis propter
labelli cum lobis latis et lobo terminali bilobato
fimbriis brevissimis instructo, sed ab ambobus
speciebus labello cum lamellis latis basalibus
et callo conspicuo in apicem differt.
Epífita,
planta cespitosa, 2-3 cm de tamanho. Rizoma
bastante pequeno, inconspícuo. Pseudobulbos
cilíndricos, 3-5 × 3-4 mm, unifoliares,
vináceos, coberto de bainhas apergaminhadas. Folha
cilíndrica, 15-20 × c. 4 mm,
carnosa, canaliculada, vinácea, superfície
verrugosa, ápice acuminado. Inflorescência com racimo de 1 flor, com 2 cm de comprimento.
Flores na cor lavanda-claro até branca, labelo com traço rosado na porção
mediana entre os lobos laterais e o ápice com calo amarelo, sépalas
lanceoladas com 9 × 4 mm,
sépalas laterais livres, ligeiramente falciformes, pétalas linear-lanceoladas,
com 8 × 3 mm, labelo trilobado,
com 7 × 7 mm, lobos laterais triangulares, obtusos, com 7 mm diâmetro.
Lobo central ovo-lanceolado com 5 mm de diâmetro, disco bi-lamelado
na base, lamelas lanceoladas, com 4 mm., brancas, bases mais grossas,
convergentes, ápice agudo; calo apical linear, com 1.5 mm de comprimento, amarelo, coluna com 2
mm de comprimento; estigma amplo, inteiro.
Cápsula rosa-vinácea, lanceolada, com 3cm
de comprimento.
ETIMOLOGIA: Nome
faz referência à Vellozia sp. sobre
a qual esta espécie foi encontrada em seu habitat natural.
PARATIPOS: BRASIL,
Bahia: Chapada Diamantina, 30 OCT 2005 (com cápsula). E.C.
Smidt, C. van den Berg & S. Marçal 652 (HUEFS).
DISTRIBUIÇÃO:
Conhecida
para uma única localidade na Chapada Diamantina.
HABITAT: Epífita
em local sombreado em caules de Vellozia
sp. em vegetação rala em afloramentos
rochosos.
COMENTÁRIOS:
Leptotes
vellozicolla cresce exclusivamente em Velloziaceae, em
vegetação de campos rupestres, a
900 m de altitude. Morfologia floral é
muito similar àquela do L. tenuis
Rchb.f. e L. pauloensis, considerando a forma de seu labelo com amplos
lobos laterais e o lobo terminal bilobado
com um ápice com fímbrias curtas. Entretanto,
pode ser diferenciado de ambos por suas duas lamelas basais e
pelo calo no ápice. Leptotes pauloensis
tem flores rosas, os lobos laterais mais estreitos do que o lobo
central, lamela basal estreita
e não apresenta calo no ápice no labelo enquanto que L.
tenuis possui flor creme-esbranquicada
com uma área púrpura junto à base, lamela estreita e pequena e
ausência de calo. Esta espécie é a única no gênero crescendo em
Vellozia sp., que é por si mesmo
uma ligação muito interessante considerando que este padrão é
muito similar com aquele de Constantia
e Pseudolaelia. Isto pode
sugerir que esta espécie é bastante residual, uma espécie
basal no gênero, além L. blancheamesiae
Loefgr. O labelo bilobado
fimbriado também sugere uma relação entre este último, a
nova espécie, L. pauloensis e L. tenuis.
A filogenia das espécies dentro do gênero Leptotes
precisa ser reavaliada para examinar em detalhe estas hipóteses.
O local exato não é revelado para proteger esta espécie da coleta
ilegal, uma vez que a única população conhecida não se encontra
em área protegida.
STATUS
DE CONSERVAÇÃO: Vulnerável
(IUCN critério Vu D2). Leptotes vellozicola foi
encontrada, até agora, na parte sudeste da Chapada Diamantina,
em uma área restrita que justifica o critério D2
da IUCN. A área está sujeita freqüentes incêndios
que são uma clara ameaça a esta única população
conhecida ao mesmo tempo que provocam a destruição
das espécies de Vellozia nas quais a esta espécie
cresce.
|
|
Fig.
1. Leptotes vellozicolla Van den Berg,
E.C.Smidt & Marçal.
A. Plantas em flor. B. Análise Floral.C. Coluna, vista
adaxial. D. Labelo, vista lateral. (Ilustração:
Smidt et al. 650, holotype). Desenho de C. de Lima.
|
|
Fig
2. Leptotes vellozicolla Van den Berg,
E.C.Smidt & Marçal.
A. Planta crescendo com epífita Vellozia sp.
B. Flor. C. Close-up da flor.
|
Literatura
citada
1) Bentham, G. 1881. Notes on orchideae. Journal
of the Linnaean Society, Botany 18:281-360.
Campacci, M. 2005. Leptotes bohnkiana
2) Campacci.
Boletim CAOB 53:18-20. Castro Neto, V.P.
& Chiron, G.R. 2004.
3) Contribution à la conaissance des orchidées
du Brésil.
I. Une nouvelle espèce de Maxillaria
de Espirito Santo. II. Une nouvelle espèce
de Leptotes de Bahia. Richardiana
4:73-82.
4) Cogniaux,
A. 1902. Leptotes. In: Martius, C.F. Flora
Brasiliensis 3 (5):254-259.
5) Krackowizer,
F.J. 1954. Monografia do gênero Leptotes.
Parte I. Revista do Círculo Paulista de
Orquidófilos 11:43-53.
6) Krackowizer,
F.J. 1954. Monografia do gênero Leptotes.
Parte II. Revista do Círculo Paulista
de Orquidófilos 11:64-72.
7) Lindley,
J. 1853. Folia Orchidacea: Leptotes. 3rd.
Ed. Bradbury & Evans, London.
8) Löfgren,
A. 1918. Contribuições para a flora
Orchidacea. Archivos do Jardim Botânico
do Rio de Janeiro 2:49-62.
9) Pabst,
G.F.J. & Dungs, F. 1975. Orchidaceae Brasiliensis
Vol. I. Brücke-Verlag Kurt Schmersow, Hildesheim,
Germany.
10) Smidt,
E.C. & Toscano de Brito, A.L.V. 2004. A new
species of Sarcoglottis (Orchidaceae -Spiranthinae),
from the Chapada Diamantina, Bahia, Brazil. Kew
Bulletin 59:4-7
11) Van
den Berg, C. & Gonçalves, C.N. 2004.
Adamantinia, a showy new genus of Laeliinae
from Eastern Brazil. Orchid Digest 68:230
232.
12) Van
den Berg, C.; Higgins, W.E.; Dressler, R.L.; Whitten,
W.M.; Soto Arenas, M.A.; Culham, A.; Chase, M.W.
2000. A phylogenetic analysis of Laeliinae (Orchidaceae)
based on sequence data from Internal Transcribed
Spacers (ITS) of nuclear ribosomal DNA. Lindleyana
15:96 114.
13) Whithner,
C.L. 1993. The Cattleyas and their Relatives.
Vol.III. Timber Press, Portland, Oregon. |
Fotos
enviadas pelos autores
Expressamente
proibido qualquer tipo de uso, de qualquer material deste site
(texto, fotos, imagens, lay-out e outros), sem a
expressa autorização de seus autores, sob pena de
ação judicial. Qualquer solicitação
ou informação pelo e-mail:
bo@sergioaraujo.com |
|