ON: Quem participava da sociedade na época que o senhor entrou?

WS: O Zico, o Jorge Verboonen, o Exdras Porto... Esta turma toda. O Exdras Porto e o Jorge Verboonen foram os últimos acionistas da S.B.O.

ON: Como foi a convivência do senhor com este pessoal mais antigo? O Rolf Altenburg, o Zico...

Lycaste Jason.Foto/Photo: F. Miranda
  WS: O Rolf Altenburg, conheci quando eu tinha 18 anos, em Niterói, onde eu morava também.
Eu fazia parte do Clube de Regatas de Gragoatá, e remava lá. E aos domingos o Rolf Altenburg e os outros alemães iam também remar. Assim nós nos conhecemos.
Anos mais tarde, depois que virei orquidófilo, é que me reencontrei com ele. Depois também conheci o Zico, que era genro do Rolf. O nome dele era Siegwald Odebrecht, mas como era muito difícil virou Zico.


ON: Qual foi o papel de Rolf Altenburg no desenvolvimento da orquidofilia?

WS: O Rolf desenvolveu muitos híbridos, ele inclusive mandou vir de Hamburgo, na Alemanha, um especialista em cultivo para fazer aquelas hibridações que ele fez. Ele chegou a se associar com o Binot, mas tudo isto é conhecido, não é novidade, já saiu na revista da OrquidaRIO.

ON: Acho que o híbrido mais famoso é a BC. Pastoral, que foi posteriormente usado em mais de 70 novos cruzamentos registrados, mas tem também Cattleya Sonia Altenburg que foi meristemada e até hoje é muito comum nas exposições da Alemanha. Entre os anos 50 e 80, ele fez muitos híbridos, embora não tenha registrado todos...

WS: Eu tenho a lista de híbridos ..., olha só a quantidade de híbridos que eles fizeram.

ON: Por esta lista, ele fez mais de 2.000 híbridos. Aqui já está em 2.008, mas a partir daqui os números estão saltados. Por que?

WS: Porque ele fez outra numeração para outros gêneros, como o Phalaenopsis, por exemplo.

ON: Como era o panorama da orquidofilia no Rio de Janeiro nesta época? E quando começou a existir uma coisa mais organizada, mais estruturada?

WS: Foi quando começou a Sociedade Fluminense, depois S.B.O., em Niterói. Foi se desenvolvendo... Inclusive escrevi um artigo sobre isto na revista Orquidário, abordando o início, o desenvolvimento da orquidofilia no Brasil (Revista Orquidário - Volume 10, nº 2, abril a junho de 1996).
Quando eu comecei, os orquidários já existiam e já havia um movimento grande. Mas o movimento aqui, no Brasil, começou mesmo por volta do último milênio. Foi aí que começou, pois consta que os primeiros orquidófilos foram os oleiros, nos subúrbios de São Paulo, onde hoje é o bairro de Pinheiros. Lá tinha uma porção de olarias e elas recebiam as lenha do interior e nelas vinham orquídeas, "parasitas", presas. Então eles achavam bonito, tiravam fora aqueles tocos e as penduravam nas árvores ou nos beirais dos telhados de suas casas. Este é o princípio. Mas quem foi o grande incentivador, mais tarde, nas décadas de 20 e 30, foi o Luyz de Mendonça e Silva, que fundou a Sociedade Fluminense de Orquidófilos, a primeira sociedade de orquidófilos, em Niterói. Em l938, ele fundou a revista "Orquídea". Posteriormente esta sociedade se transformou em Sociedade Brasileira de Orquidófilos, com sede na cidade do Rio de Janeiro. Esta sociedade contava com a presença de grandes nomes como Guido Pabst, Rolf Altenburgh, Afrânio Silva Jardim, Jader Manso, Felisdoro Bastos Nunes e outros.

   

  ON: Nesta época, existiam quantos orquidários aqui?

WS: Praticamente só existiam o Binot e a Florália. Tinha um outro também em Petrópolis, mas acabou depois.

ON: Eram quantos cultivadores, colecionadores?

WS: Isto é muito difícil falar, calcular. Em Petrópolis, por exemplo, praticamente todo mundo tem uma orquídea em casa, porque estão ali perto. De vez em quando compra um vaso, leva para casa, morreu, vai comprar outro.

  ON: Mas, e de uma maneira mais organizada, com coleções maiores? Eram quantos? Havia mais pessoas cultivando do hoje ou hoje têm mais?
  WS: Hoje têm mais, naquela época tinha pouca gente. Guilherme Guinle também tinha um orquidário.
Ele importava muito da Europa, mas com a sua morte acabou tudo.


ON: Vocês se encontravam para conversar sobre orquídeas?


WS: Não, isto foi anterior à época que comecei.
Antes de 1944.
  ON: Mas o senhor não tem notícia se este pessoal se encontrava, se reunia?

WS: Era cada um por si.

ON: Então o senhor tinha suas orquídeas e os outros também tinham. Não havia nemhum contato entre os cultivadores?

WS: Isto só começou depois que se fundou estas sociedades, que eram freqüentadas por orquidófilos, quando estes contatos passaram a existir, mas antes disto não havia nenhum.

ON: Nem informal?

WS: Nem informal.

ON: Quer dizer que tudo o que senhor sabia ou aprendia sobre orquídea era por conta própria?

WS: Era por conta própria.

ON: E o cultivo, como era? Por exemplo, as pessoas tinham acesso a todas as espécies, gêneros ou era mais limitado?

WS: No princípio, o cultivo era mais limitado às espécies locais, no nosso caso as orquídeas do Rio de Janeiro. Naquele tempo ainda se podia ir no mato e tirar planta. Tirava-se planta do habitat e cultivava-se em casa. Era tudo muito primitivo, geralmente eles amarravam em cima de pedaço, num toco de árvore.

ON: Avançando para os anos 80, quando o senhor entra para a sociedade. O que esta sociedade fazia? Por que o senhor entrou? Qual foi a motivação?

WS: Eu estava curioso para aprender. Eu fui a uma exposição e vi lá o pessoal, aí achei que entrando para a sociedade eu iria ter mais conhecimento. Como de fato tive, não é?
Foi assim que entrei para a sociedade.


ON: Quem fazia parte desta sociedade?


WS: Álvaro Pessoa, Francisco Miranda, Roberto Agnes, Alex Sauer, com quem tive uma amizade mais próxima. Ele inclusive fez um híbrido e registrou com meu nome. Lc Waldemar Scheliga

  Foto/Photo: Sergio Araujo ON: Que híbrido é este

e quando foi isto?



WS: É um cruzamento de

L. lobata

X

Lc. Canhamiana,

registrado

em

l993.




  ON: Qual tem sido o papel da sociedade no sentido de levantar o movimento orquidófilo do Rio de Janeiro? O senhor acha importante o papel da sociedade para maior divulgação da orquidofilia?

WS: Ah, é importante, com certeza.
Por intermédio das exposições, é despertado o interesse de outras pessoas e muitas deles tornam-se orquidófilos. Infelizmente,nem todos pois uma parte é fogo de palha, passado aquele primeiro entusiasmo, cansa e vai embora. Sempre alguns ficam. De forma que o papel da sociedade é justamente este, de divulgar e ela consegue isto.
Depois de cada exposição têm quase 100 novas assinaturas, novos sócios. Destes 100, se ficar a metade já é uma grande coisa. A OrquidaRIO já chegou a ter 1.000 sócios, mas atualmente está reduzido a, mais ou menos, 600. Agora mesmo fez-se uma campanha para ver se cada sócio arranjava um novo sócio e aí passaria para 1.200. Eu fiz minha parte, mas nem todos fizeram.


ON: Sr. Waldemar, o senhor pode ter diminuído um pouco seu envolvimento com o cultivo, mas a sua produção intelectual continua muito intensa, como tem sido, aliás, ao longo destes anos todos.
Além de ter sido sócio-fundador, vice-presidente e presidente do conselho deliberativo, o senhor faz parte da comissão editorial da revista Orquidário desde l990, pelo menos.
É raro que aconteça alguma edição sem que haja alguma tradução sua ou mesmo um artigo.O senhor promove um intercâmbio grande de informações através de suas traduções.
Freqüentemente podemos ler trabalhos diversos, publicados originalmente em alemão, traduzidos pelo senhor. Todo este trabalho de Senghas, Rudolf Jenny, Irene Bock e outros, que vêm da Alemanha, nós só temos acesso através de sua tradução. Como é isto?


WS: Se vejo um artigo interessante, eu peço licença para publicar aqui. Mas faço o contrário também, quando vejo um artigo interessante como este do Kleber Lacerda, publicado na Caob, falo com o responsável, no caso Oscar Sachs, e traduzo para publicar na Alemanha. O pessoal daqui, eu ajudo a divulgar na Alemanha.
A revista "Die Orchidee" tem uma tiragem de 8.000 exemplares e é vendida não só na Alemanha, como na Europa e nos Estados Unidos. O Campacci vai mandar descrições de novas orquídeas para serem publicadas na Alemanha na "Die Orchidee". Vão ser publicadas em alemão e em inglês.
Também traduzi os artigos do Miranda sobre as Laelias, em três partes, além de dois artigos do Álvaro Pereira e do Luiz Álvaro, pai e filho.
Escrevo artigos que já foram publicados na revista da OrquidaRIO e também no Mundo das Orquídeas.
Agora mesmo, estou fazendo um artigo sobre o Hoehne para ser publicado na Alemanha. Não é muito divulgado, mas Hoehne foi diplomado Doutor Honoris Causa na Universidade de Göttingen. Neste trabalho que vai sair agora, além da foto que obtive no Jardim Botânico de São Paulo, será reproduzido também este diploma. Os alemães arrumaram uma cópia do original e vão publicar junto com o artigo.
Eu agora escrevi um artigo sobre Jorge Verboonen para a Alemanha, sobre a vida dele e, inclusive, sobre o orquidário Binot, que foi inaugurado há mais de 100 e que é considerado o mais antigo do mundo.

Foto/Photo: Sergio Araujo ON: Além de suas atividades de cultivador e editoriais, a senhor foi responsável pela recuperação do orquidário do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e treinamento do pessoal, tendo inclusive recebido o diploma de Benemérito daquela Instituição por " serviços relevantes prestados à casa de D. João VI". Como foi esta passagem?

WS: Isto foi no período de 90/91. Os trabalhos de reorganização foram coordenados por mim.
Eu era vice-presidente da OrquidaRIO naquela época. Obtivemos de diversos sócios e de orquidários comerciais a doação de plantas e materiais.
A coleção foi também enriquecida com o trabalho de botânicos que iam a campo fazer pesquisas.
No final de 91, depois de recuperado com a ajuda, apoio e assistência técnica da OrquidaRIO, o Orquidário do Jardim Botânico foi reinaugurado.


ON: Quer dizer que o senhor chegou lá através da OrquidaRIO?

WS: A OrquidaRIO precisava organizar o orquidário e Raimundo Mesquita, presidente da sociedade na época, propôs a Miranda e a mim, mas ele tirou o
  corpo fora. Eu tive muita dificuldade, não havia colaboração.

ON: As instalações lá são adequadas?

WS: É muito escuro. Seria necessário mudar as telhas, que estão muito velhas, amareladas. Hoje em dia têm umas telhas mais modernas, que vêm de São Paulo e que são leitosas, mais fáceis de limpar.

ON: Tem-se criticado muito aquela estufa de vidro que, embora belíssima, é muito quente, mas apesar disto, certas plantas vão muito bem lá dentro, como exemplo, Cattleya guttata, Cattleya amesthystoglossa, Cattleya loddigesii, Arachnis, Vanda tricolor, Renanthera, Bulbophyllum, Arundina, Oncidium baueri e outras.

WS: Aquela estufa, muito antiga, onde inclusive ainda está escrito "orchideario" é uma cemitério para orquídeas, é muito quente. Eu, inclusive, fiz uma proposta: se quisessem aproveitar aquelas instalações, seria preciso colocar uns ventiladores-exaustores para movimentar o ar lá dentro. Inclusive eles sabiam disto, tanto assim que têm uns chuveiros em cima do telhado, mas aquilo não adianta ligar pois começa a chover mais dentro do que fora.

 
ON: Ao longo destes anos todos
em que o senhor está neste meio,
o progresso genético foi positivo,
foi importante?




WS: Foi, porque sempre se cuidou
de novas hibridações,
criando-se novas plantas.
Plantas mais bonitas
e mais interessantes.





Phragmipedium x schroederae. Foto/Photo: W. Scheliga




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