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Palavras-chave:
Brasil, Espírito Santo, Mata Atlântica,
Orchidaceae, Pseudolaelia.
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Resumo
Este artigo descreve Pseudolaelia ×perimii, um híbrido
natural recentemente descoberto nas montanhas do Espírito Santo,
Brasil, cruzamento entre a Pseudolaelia brejetubensis M.
Frey e a Pseudolaelia freyi Chiron & V.P. Castro. As
três plantas são comparadas. São apresentadas
informações sobre a ecologia e a distribuição
geográfica dessa nova planta. Este artigo foi publicado na
revista Richardiana Vol V (3), de julho 2005, nas páginas 158
a 164.
O Monte Feio,
inselberg granítico do Município de Brejetuba (Espírito
Santo, Brasil) já proporcionou recentemente (Chiron & Castro
Neto, 2004 ; Frey, 2003) duas novas espécies de Pseudolaelia.
Não é de se espantar que tenhamos encontrado uma planta
que apresenta os caracteres de um híbrido natural entre as
precedentes. Enfeudada, como as outras, às placas de litossolo
que se formam no topo dos inselbergs, próxima, senão
tributária das Velloziaceae que os povoam, desaparecendo
de todas as áreas eutrofisadas, particularmente aquelas invadidas
pelas Poaceae, ela chama atenção, à
primeira vista, por seus caracteres verdadeiramente intermediários
que discutiremos abaixo.
Pseudolaelia
× perimii,
M. Frey, Richardiana Vol
V (3) - Juillet 2005 - 158:164
Herba rupicola hybrida naturalis inter Pseudolaelia brejetubensis
M. Frey et Pseudolaelia freyi Chiron & V.P.Castro.
Holótipo: Brasil, EspíritoSanto, Brejetuba, Monte Feio,
20° 10’ 35’’ à 20° 11’ S, 41°
16’ 45’’ à 41° 17’ 15’’
W, altitude 1 100 à 1 400 m, mai 2002, M. Frey & L.C.F.Perim
231 (holótipo : MBML). Isótipo : M. Frey & L.C.F.Perim
847 (LY).
Descrição
Planta herbácea, em princípio litófita, às
vezes se agarrando um pouco aos galhos vizinhos de diversas Velloziaceae.
Porte ereto, com 30-60 cm de altura. Rizoma cilíndrico,
3,5 à 5 mm de diâmetro, 2,5 à 5 cm de distância
entre os pseudobulbos, revestidos de numerosas bainhas escariosas
de curta duração, curtas e imbricadas; raízes
muito numerosas, nascendo ao longo do rizoma, simples, cilíndricas,
com até 15cm de comprimento, 1,5 à 2,5 mm de diâmetro,
brancas; pseudobulbos ovóides, muito ligeiramente comprimidos
lateralmente, 4,5-5,5 × 2,5 cm, formados por 5 entrenós,
revestidos de bainhas escariosas primeiro caducas, depois lisas, tornando-se
irregularmente multiestriadas, verdes com marcas púrpuras,
inicialmente, tornando-se púrpuras com a idade; folhas 2-3
(5) , nascendo no ápice do pseudobulbo, dísticas, linear-lanceoladas,
as inferiores mais longas do que as superiores, indo até 15
cm × 12 mm, dobradas sobre a nervura mediana, extremidade aguda,
glabras, margens finas e irregularmente dentadas, verdes com traços
púrpuras em direção à extremidade e margens
púrpuras, caducas com um ano, ao nível da abscissão
a 1 cm abaixo do ápice do pseudobulbo, 9 nervuras paralelas
visíveis em transparência; inflorescência
ereta, saindo do alto do pseudobulbo, entre as folhas; pedúnculo
persistindo seco um ano após a floração, altura
de até 50 cm, ligeiramente achatado lateralmente, aproximadamente
2 ,5 mm de largura, 1,5 mm no princípio do ráquis, verde
púrpura, revestido de 6 à 10 bainhas escariosas, imbricadas
até a metade da altura, comprimento de 7 cm na base, 2 cm no
ápice; ráquis de 10-15 cm, um pouco paniculadas (2-3
ramificações), carregando até 12 (15) flores,
as ramificações de 6 à 8; brácteas eretas,
pequenas, triângulo-agudas, membranosas, amarronzadas, com 3-4
mm de comprimento; pedicelo com o ovário estendido, atingindo
até 20 mm de comprimento, o pedicelo é vermelho-púrpura
intenso, o ovário é mais escuro e um pouco marrom;
flores bastante abertas, horizontais, largura de 32mm, altura
de 25mm, com 18 mm de profundidade, rosa claro com nervuras e as bordas
rosa mais escuro; sépalas com até 18-20 mm ×
3 mm, linear-oblongas, um pouco liguladas, com as bordas encurvadas,
extremidade aguda, glabras, margens lisas, 3 nervuras rosa mais escuro,
algumas máculas rosa mais escuro em direção à
extremidade; pétalas com até 18-20 mm ×
2 mm, linear-oblongas, extremidade aguda, com as bordas um pouco encurvadas,
glabras, margens lisas, nervura rosa mais escuro e glabras, margens
lisas, uma nervura rosa-escuro e máculas rosa mais escuro em
direção à extremidade; labelo trilobado,
com até 15 mm de comprimento por 8 mm de largura, os lobos
laterais 10mm estendidos, se prolongando em direção
à parte de trás por um nectário soldado ao ovário,
arredondado, púrpura claro, aproximadamente 1 mm de diâmetro,
disco soldado à coluna até à sua metade, canaliculado
por dois grandes calos semi-cilíndricos, branco amarelado com
bordas rosas, lobos laterais divergentes do eixo do labelo em 60°,
em forma de meia-lua, virado para trás, extremidade obtusa,
4,5 mm × 2 mm, brancos marcados com três veios rosa-escuros,
ramificados e com uma mácula rosa-escura na extremidade, lobo
mediano ligeiramente ungüiculado, unha de 2 mm × 2 mm,
onde os calos se atenuam depois se abrem em lobo amplo, oval, de bordas
onduladas e encurvadas, centro amarelo claro, formado de 7 calos puberulentos
escalonados, o mediano mais longo, na periferia das quais o lobo torna
a ficar branco com numerosas estriais ramificadas, centrífugas,
rosa-escuro; coluna com 5 mm comprimento e 3 mm na extremidade,
verde-púrpura escuro, com duas asas laterais em direção
da ponta, pontudo em direção à frente, branco
esverdeado, envolvendo o estigma ventral e a antera; antera terminal
púrpura escurecida, contendo oito políneas amarelo-ouro,
agrupadas dentro de quatro caixas justapostas, sub-iguais. Ver figura
1.
Etimologia
O epíteto específico é uma homenagem a Luiz Carlos
Feitosa Perim que descobriu esta espécie.
figura 1 |
figura 1 (detalhe) |
Habitat
e distribuição geográfica
A espécie é encontrada sobre a mesma superfície
reduzida de Monte Feio de Brejetuba onde já foram descobertas
e descritas as duas espécies consideradas como sendo seus pais.
P. freyi, bem mais abundante, preenche a totalidade dos biótipos
com milhares de plantas. P. brejetubensis, bem pouco espalhada,
só ocupa um pequeno número de lugares neste espaço
e a Pseudolaelia ×perimii, como poderia se esperar
para um híbrido entre os dois, só foi encontrada, até
agora, próxima dos lugares onde cresce a P. brejetubensis.
Sem ser verdadeiramente vellozicola como a P. freyi, P.
×perimii se acomoda à vizinhança destas monocotiledoneas
bastante típicas do biótipo e, algumas vezes, se apóiam
sobre elas.
Discussão
P. × perimii apresenta muitos pontos de caracteres intermediários
que justificam a tese. Os pseudobulbos, agregados na P. brejetubensis,
são distanciados, mas menos do que na P. freyi. Igualmente,
onde as inflorescências de P. brejetubensis são
panículas com numerosas ramificações (3 à
6) e as de P. freyi são em racimos, com, eventualmente,
uma ramificação que se desenvolve tardiamente, P.
×perimii possui inflorescência paniculadas, com um
máximo de três ramificações. O nectário
verde proeminente que é uma das características mas específicas
da P. brejetubensis reaparece na P. ×perimii,
mais atenuada, enquanto não existe na P. freyi. P.
brejetubensis abre no mês de abril, enquanto que a P.
freyi só floresce no fim do mês de maio e sobretudo
em junho. P. ×perimii abre plenamente em meados de maio.
Enfim, o aspecto geral da planta, que combina a finesa P. brejetubensis
e la rondeur de P. freyi, permite realmente pensar que se trata
de um híbrido natural, fenômeno que não é
raro do sudeste brasileiro onde já foi observado várias
vezes no grupo das Laeliineae em particular. Talvez seja interessante
assinalar que, depois da descrição de P. brejetubensis,
esta espécie foi também encontrada sobre a Pedra da Invejada,
Município de Lajinha, no estado vizinho de Minas Gerais. P.
freyi não foi observada fato que reduz as chances do híbrido
ser encontrado no local. Igualmente, P. freyi foi encontrado
sobre o morro bem próximo onde foi instalada a antena de televisão
de Brejetuba, mas a P. brejetubensis não foi encontrada.
Enfim, uma informação que carece de confirmação
sobre a ocorrência de P. freyi no morro de Lajinha, município
de Afonso Cláudio, no Espírito Santo, e não muito
longe do monte Feio, mas, como P. brejetubensis não
foi observada, parece inútil procurar este híbrido.
Entretanto, existe ainda grandes chances de novas descobertas neste
domínio, até agora pouco explorado. Withner, em artigo
sobre Pseudolaelia, escrito, é verdade, em 1993 : «
um gênero brasileiro pouco conhecido » ! Realmente, parece
que os esforços dos orquidófilos são feitos nas
florestas e menos nos cumes dos inselbergs. Igualmente haveria ainda
muito a se fazer no domínio das Bromeliaceae e das Velloziaceae,
abundantes nestes biótipos muito especiais.
Bibliografia
Chiron, G.R. & V.P. Castro Neto, 2004. Une nouvelle espèce
de Pseudolaelia (Orchidaceae : Laeliinae)
d’EspíritoSanto (Brésil). Richardiana IV(4) : 156-162
Frey, M., 2003. Pseudolaelia brejetubensis M. Frey (Orchidaceae),
uma nova espécie do Espírito Santo, Brasil. Bradea 9(8)
: 33-36
Withner, C. L., 1993. The Cattleyas and their relatives, vol.3, Timber
Press, Portland (Oregon) USA.
Michel Frey:
sitio Capijuma, Alto Ribeirão do Meio, Conceição
do Castelo, 29375-E.S. Brasil
michel_frey@terra.com.br
Foto: Michel Frey
Ilustração:
Luca Fontani